terça-feira, 7 de julho de 2015

Morte e vida



Uma pessoa muito querida vem sofrendo muito pela morte de alguém muito importante em sua vida. Isso me levou a escrever algumas poucas linhas a respeito do tema.
Todos nós, cedo ou tarde, passamos pela experiência de “perdermos” alguém. A vida, embora todos saibamos ser passageira, nunca nos prepara para momentos da separação provocada pela morte. E a dor é maior quando se trata de uma mãe, um pai ou, ainda pior, um filho.

Aquilo que conhecemos acerca da morte é diretamente proporcional àquilo que conhecemos sobre a vida, isto é, muito pouco. Quem de nós pode dizer que sabe algo desse fenômeno chamado vida. De que é feita? E para quê? E como desconhecemos as respostas para tais perguntas, acabamos por ignorar o real sentido da morte.

Em verdade, a morte é um processo percebido por nós como terminal em razão da nossa incapacidade de enxergar a sua real natureza. E ela em nada difere da experiência a qual chamamos vida, neste plano. Na verdade, a existência em si é una. Todas as manifestações que percebemos como pensamentos, sentimentos, ou sensações como o frio, o calor, a luz, tudo isso provém de uma fonte única, que é tudo aquilo que existe e do qual tudo é feito.


Imaginemos o universo sem os “seus” elementos. O que seria dele sem as estrelas, os planetas, os buracos negros, sem nada? E se além disso tirarmos o próprio espaço da equação? O que sobraria? É possível, então, que o nada passe a (in)existir? Não, porque a existência em si não é um fenômeno que dependa da matéria, embora a nós pareça, já que tal dependência é o que nos resta em um mundo regido pelas leis da física.

Bem, e o que isso tem a ver com a vida ou a morte? 

Aquilo que comumente chamamos vida, isto é, o parêntesis situado entre o nascimento e a morte de nosso corpo físico, nada mais é que um fenômeno pelo qual é criada uma divisão fictícia entre o indivíduo e tudo o mais existente. Nesse palco material, o universo é dividido em um sem fim de seres individuais, todos eles incompletos e em busca de algo que, no fim e ao cabo, é a (re)união com a energia primordial, que deu origem a tudo. Alguns chamam essa energia de Deus.

Enquanto esse reencontro não acontece, permanecemos seres aparentemente isolados em armaduras de carne e ossos, olhando com desconfiança para os que estão na mesma situação. O mundo se torna perigoso já que, sendo cada animal, humano ou não, separado dos demais, é necessário que eu proteja o que é “meu”. É preciso que eu seja melhor que o outro. E quando o ser amado se vai, isso nos devasta.

Mas a boa notícia é que ninguém se vai. O fenômeno da criação possui uma lógica bastante singela: nenhum ser morre. Tudo o que existe é eterno, como o Alfa e o Ômega, já que somos partes de Deus. Existimos desde sempre (e para além do conceito de sempre), e vamos existir eternamente. Se prestarmos bem atenção, a eternidade está acontecendo agora mesmo, mesmo se estivermos sentados em nossa cadeira, em casa ou no escritório, ou em pé na fila do metrô ou do banco. O momento presente é a eternidade, e ele está disponível para qualquer um que queira prestar atenção ao que está fazendo e pensando neste exato momento.

O que provoca este sentimento de divisão é a nossa mente. O que provoca a sensação de perda diante da morte (ou de ganho, diante do nascimento) é esse fluxo incontrolável de pensamentos ao qual denominamos mente. É ela que cria e alimenta as nossas sensações emocionais, embotando-nos os demais sentidos diante do sofrimento. É ela que faz com que não tenhamos a direção da nossa vida, sempre a ordenar que façamos ou deixemos de fazer coisas contra a nossa vontade. E, ao sucumbirmos às nossas verdades mentais, o sofrimento nasce.

Todos nós possuímos um corpo emocional, que vibra de acordo com nosso condicionamento diante dos mais variados estímulos. E isso não tem nada a ver com a nossa vontade. Está além dela. Tente controlar seu corpo emocional diante da morte de uma pessoa querida. Isso só não é difícil como impossível. Assim como a natureza da água é molhar, a do corpo emocional é sentir, vibrar autonomamente.

A solução para o nosso sofrimento diante da perda é a aceitação, que só é possível através do contato com a unicidade inerente a tudo e a todos. Somos feitos da mesma matéria original. Somos partes indivisíveis do todo. Mas tal aceitação também não está no nível mental. Não podemos simplesmente ordenar que ela nos visite e nos acalme a alma. Precisamos estar conscientes da existência da mente e do corpo emocional.

Esses dois “entes” se alimentam de energia “roubada” de nós. E essa energia, que é o combustível que faz com que eles funcionem é a nossa atenção. Sim, quando focamos a nossa atenção a algo, emprestamos (ou doamos, voluntariamente ou não) uma parcela de nossa energia a isso. Seja um relacionamento, um problema de matemática, um pensamento ou sentimento. Para ser mais preciso, quando nossa atenção está focada em um pensamento, fortalecemos sua raiz, localizada na mente. O mesmo ocorre com o sentimento e o corpo emocional.

Mas quando nos tornamos conscientes desse processo, passamos a perceber que, na verdade, não somos nenhuma dessas manifestações. Se podemos observar o surgimento de nossos pensamentos ou de nossas emoções, há uma dimensão de consciência anterior a eles, que pode reconhecê-los e observá-los. Ocorre o mesmo com o corpo físico, que pode ser observado por algo, ou alguém, que somos nós mesmos.

A raiz de nossos problemas, incluindo a não aceitação diante do falecimento corporal de alguém, está exatamente nos condicionamentos que vinculam o funcionamento da nossa vontade. Se julgamos que a morte física é o fim, teremos motivos mais que suficientes para sofrer uma perda irreparável. No entanto, todo ser humano de alguma maneira (pré)sente que isso não é verdadeiro. A luz da consciência jamais se apaga, mesmo diante da dissolução do corpo.

Pare por um instante e procure observar seus pensamentos e sentimentos. Busque a fonte de seu sofrimento. Existe algo lá, ou somente um emaranhado de conceitos e (in)certezas surgidas da nossa inconsciência? O que são as saudades, verdadeiramente, além do nosso próprio medo de deixarmos de existir?

Silencie. Observe o momento presente, onde tudo ocorre. Aí você encontrará o alento que precisa, que só chega no momento em que observamos e entendemos os processos que nos fazem sofrer ano após ano, vida após vida. Essa nova compreensão nos fará compreender que temos plenas possibilidades de encontrar a paz que tanto procuramos.

Os mortos não estão mais mortos do que nós mesmos, nem mais vivos. Eles simplesmente estão, e guardam sua individualidade. Nada pode mudar essa realidade.

Abra as portas da sua percepção para receber as bênçãos da aceitação, através dessa singela observação a respeito das forças que te dominam e que estão, provisoriamente, no comando da sua vida. Pouco a pouco, é possível atingir a emancipação que nos trará a paz e a certeza de que não existe a morte.

Todos somos para sempre.

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